June 20, 2005

A Cidade do Pecado

Porque o belo filme está nas salas de cinema e porque a perguiça não me permite escrever mais que isto, aqui fica uma crítica que fiz ao primeiro volume da versão portuguesa de SIN CITY, pela Devir.

"Feio, brigão e não muito inteligente, Marv não está habituado a que as mulheres lhe dêem atenção. Um dia sai-lhe a sorte grande, mas ao acordar da inesperada noite de paixão com Goldie, perfeita e de beleza angelical, encontra-a assassinada. Momentos depois, a policia bate-lhe à porta e, vendo-se apanhado numa armadilha, Marv inicia a busca do culpado da morte da mulher que o fez sentir-se especial. E nada, nem ninguém, se conseguirá opor-lhe.

Quero deixar já clara uma coisa: A CIDADE DO PECADO é uma obra-prima, genial e sem falhas. Inspirada nos policiais de Mickey Spillane, esta obra apresentou, no início dos anos 90, a cidade onde Frank Miller situaria depois outros contos. A CIDADE DO PECADO foi, na altura da sua publicação original, uma reviravolta artística de Miller. Inspirado, entre outras fontes, pela manga japonesa, e mantendo o dinamismo e habilidade narrativa que já lhe eram habituais, o autor norte-americano aproveitou-se do formato preto-e-branco para experimentar ou aprofundar diversas técnicas: utilização de vários painéis de página inteira; sequências "silenciosas" sem diálogo ou texto; monólogos internos do protagonista fora dos painéis; e muitos jogos de luz e sombras. Estas e outras técnicas foram utilizadas com uma eficácia tremenda, aumentando o dramatismo e impacto da narrativa, e ajudando na criação dos ambientes escuros e densos d'A CIDADE DO PECADO.

Com um personagem principal saido de um pulp (publicações baratas, especializadas em policiais e aventura), A CIDADE DO PECADO utiliza vários clichés do género: um inocente incriminado de um crime que não cometeu; uma femme fatale que seduz o protagonista; e corrupção das forças de autoridade. Frank Miller no entanto não se prende demasiado a essas fórmulas, e constroi um mundo próprio que posteriormente foi desenvolvendo noutras obras. Argumentista capaz de escrever momentos intensos com grande facilidade, Miller incute a esta história relativamente simples uma força invulgar. Onde outros escritores produziriam um argumento básico, digno de um qualquer filme do Van Damme, Miller vai bem fundo, e consegue agarrar o leitor pelos colarinhos. Sente-se a raiva e frustração de Marv, a tensão da narrativa e a violência das acções.

A CIDADE DO PECADO é, repito, um obra-prima. Brutal, intensa, suada e fascinante. Que finalmente o público português tenha oportunidade de a conhecer é motivo de festejo. Espero que a Devir tenha sucesso com a sua publicação, de modo a que outras excelentes histórias passados n'A CIDADE DO PECADO possam vez a luz no nosso panorama editorial.
"

(escrito originalmente em Julho de 2003)

Para acabar, duas notas... Primeiro, a Devir tem realmente publicado mais volumes de SIN CITY, que valem bem a pena. Segundo, os últimos volumes de SIN CITY, ainda não publicados em Portugal, são infelizmente de uma qualidade gráfica inferior. O Miller nos últimos anos tem modificado a sua técnica e os resultados não são os melhores. O traço é, parece-me, mais espontâneo, mas tem o infeliz efeito dar às páginas um aspecto desleixado....

1 comment:

Ferrão said...

Gostei do texto sobre a BD. Realmente a sensação que se tem depois de ler Sin City é que "nos agarra pelos colarinhos" e nos embarca numa viagem alucinante até à cidade do pecado criada por Miller.
Quanto ao filme, gostei muito, mesmo muito. Se quiserem saber o que achei realmente vão até http://bandadesenhada.blogspot.com/ e leiam o texto que esctevi sobre o filme.
Gosto deste blog :)