September 13, 2005

Leituras Soltas

Bigfoot

Foi a primeira coisa que li da editora IDW, especializada nos temas clássicos do terror. O argumento de Steve Niles e do vaqueiro do metal Rob Zombie não é mau, embora seja um bocado preguiçoso. Se calhar, até de propósito. O que temos em “Bigfoot” é uma reconstituição nostálgica, sem manias nem van helsinguizações ocas e desnecessárias. Há um monstro que mata campistas na floresta. E Richard Corben desenha. Quem precisa de mais? Assim como está, está bom, mas depende muito do gosto de cada um. Sem dúvida haverá melhores comics no mercado, mas se de vez em quando sentirmos aquela urgência em consumir entertainment acéfalo onde as sombras produzam monstros e as pessoas morram num mar do seu próprio sangue, então, a IDW tem precisamente o que precisamos.

“Bigfoot” tem pouca originalidade, as personagens são quilos e quilos de carne para canhão bidimensional, e o argumento é igual a todos os filmes de monstros série b que já vimos. Mas não deixemos que isso nos desmotive de ler esta mini-série ou trade (caso venha a sair um, e virá concerteza). A arte de Richard Corben também já teve momentos mais brilhantes, mas ele continua com aquelas proporções divertidas e a atribuir aos seus desenhos aquela qualidade de plasticina muito stop-motion que nem está mal pensada e até enche as páginas de uma ingenuidade vivaça.

Deve haver outras maneiras de se escrever um conto de terror com o Bigfoot, mas se calhar, deixava de ser este Bigfoot, o clássico monstro das florestas homólogo do abominável homem das neves. E se calhar existem artistas que seriam capazes de ilustrar a história de uma forma mais sofisticada, mais sombria. Mas não foi preciso. Assim, não só entretém como ainda abre caminho para o lucrativo marketing dos peluches.


Humankind

Tony Daniel publicou através da Top Cow o seu último projecto independente, depois de um ano de ausência dedicado a estudar a arte do scritpwriting. Um ano depois, e os argumentos dele continuam a não prestar. Humankind é a prova de que o curso de um ano foi dinheiro mal gasto. E ainda me perguntam porque é que eu leio tanta porcaria. De outro modo, como poderia falar mal das coisas?

Humankind conta a história de um planeta muito parecido com o nosso, chamado Thera Os theráqueos são uma raça avançada que há centenas de anos observa a nossa patética civilização de tal modo que começou a emulá-la. Ao ponto de, lá pelo meio da história, o autor incluir um barco de piratas e uma arena de gladiadores. Estes theráqueos, apesar da sua fantástica tecnologia, incrivelmente ainda precisam de escravos. E resolveram clonar humanos (através das amostras bípedes recolhidas pelos seus discos voadores no nosso planeta ao longo dos tempo) para lhes tratar da roupa suja e da libido.

Mas estes humanos são como coelhos, e reproduzem-se a um ritmo anormal, e a sociedade theráquea em breve fica atulhada deles. Segue-se a inevitável luta de classes, e Alia Sparrow é uma detective humana seminua que pertence ao Departamento de Investigção de Crimes Humanos. A missão dela, e da sua colega robomorphica Greta, é capturar um fugitivo que chegou a Thera vindo da Terra e que, sem saber carrega dentro de si um vírus que poderá extinguir toda a raça humana em ambos os planetas.

Isto, posto desta maneira, até parece uma boa ideia. Mas Tony Daniel não sabe escrever. O melhorzinho da sua carreira a solo ainda é a série “The Tenth: Abuse of Humanity”, e este “Humankind” está a anos-luz, tanto em escrita como na arte. As mulheres seminuas já não têm aquele apelo, os monstros são despachados às três pancadas e o graphic storytelling é sacrificado no altar dos pin-ups em honra de obscuras splash pages e da lei do menor esforço. Tony Daniel ainda não conseguiu evoluir para lá do mero T&A que o resto da indústria tão esforçadamente tenta sacudir de cima dos ombros, sendo a Top Cow um dos seus últimos redutos.


Batman & Danger Girl

Por falar em T&A, algumas das suas mais bem conseguidas representantes aportam em Gotham City por obra e graça de Andy Hartnell e Leinil Francis Yu, um dos artistas que mais gosto de ver dar vida a argumentos ligeiros. Abbey Chase e as suas amiguinhas da Danger Girl fazem-se ao suculento bife financeiro que é Bruce Wayne. Claro, Bruce Wayne é também o Cavaleiro das Trevas, esse ícone indefectível da justiça e das relações suspeitas com rapazinhos.

O Joker e respectiva namorada tresloucada Harley Quinn estão no mercado para comprar parafernália de controle psíquico de massas. O vendedor é um tal Donovin Conrad, conhecido inimigo das sensuais operativas Danger Girl, que o perseguem até ao quintal do Batman em nome dos bons velhos tempos. O argumento é mais ou menos isto, mas com muitos palhaços à mistura.

Andy Hartnell escreve tudo com muito humor, e bem conseguido, para admiração minha. Batman retém a sua dignidade no meio duma torrente de one-liners, chegando mesmo a esgrimir-se de ironias com as suas lúbricas parceiras de aventura, ao ponto de nem sentir a falta de Robin no meio de tantas glândulas mamárias de banda larga. O Joker, como sempre, é quem tem as melhores deixas desta história.

A arte de Leinil Francis Yu é que é capaz de ter saído chamuscada devido à tendência poço natural que o arte-finalista Gerry Alanguilan tem para carregar no pincel. Yu desenha um Batman de queixada muito enrugado e um Joker carrancudo e de nariz protuberante que talvez não lhe fique muito bem. Mas é tudo feito com bom gosto, e o resultado final é muito bom. Surpreendentemente bom, tendo em conta as personagens de estilos antagónicos. Um crossover insólito mas de qualidade. De J. Scott Campbell é que, claro, nem sinal.

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