November 11, 2004

A Crise dos Crossovers - parte II

Reunidos então todos os ingredientes necessários, estão (quase sempre) garantidas as condições para um crossover de sucesso. O evento vai dar que falar, haverá muita expectativa, os leitores vão querer ler a história e alguns irão até comprar comics de séries que habitualmente não seguem, de modo a melhor acompanharem o crossover. Se a editora tiver sorte, muitos destes leitores continuarão depois a seguir as séries que conheceram durante o crossover... O claro objectivo foi totalmente atingido: a editora conseguiu aumentar o seu volume global de vendas, não apenas durante o decorrer do crossover, mas também depois deste terminar.


Se a editora, no entanto, tiver criado um crossover mal desenvolvido e pouco atractivo, o tiro pode-lhe sair pela culatra. Não só haverá pouca gente a comprar comics de séries que habitualmente não seguem, como provavelmente conseguiu incomodar os leitores habituais das séries que se viram envolvidas no evento. Tiveram de levar com uma história que fugia ao habitual e vão possivelmente sentir que o seu dinheiro foi mal gasto. Poderá até ser a gota de água que faz com que larguem definitivamente a série...


De qualquer maneira, quer um crossover seja um sucesso ou um fracasso, para mim a questão mais importante é a seguinte: será que é bom para os leitores que ele exista?


Cinicamente, poderia dizer que é uma iniciativa que serve apenas para conseguir extroquir (mais) dinheiro a leitores completistas, ponto final. No entanto, eu consigo ver os benefícios que os crossovers trazem a esse conceito, tão próprio ao mundo dos comics, que é o universo partilhado (por vários personagens). Um crossover bem pensado e implementado ajuda bastante a cimentar e tornar mais "realista" esse universo imaginário, pois permite reforçar as ligações entre várias séries e personagens. Tem também o potencial, nem sempre bem explorado, de permitir ao argumentista contar histórias ainda mais épicas que o habitual.


Infelizmente, grande parte dos crossovers que já segui durante a minha "vida" de leitor de comics ficaram aquém do que desejaria. E nem quero com isto dizer que os tenha achado maus. Mas a verdade é que se vou ler uma história que envolve muitos super-heróis, as minhas expectativas são (naturalmente) mais elevadas que o habitual. Desejo uma ameaça realmente poderosa, desejo confrontos realmente épicos e desejo algo realmente único. O problema é que, com o excesso de crossovers, começam-se a esgotar as idéias para histórias com esta proporção. Os mecanismos de funcionamento dos crossovers tornam-se mais visíveis e a rotina e o aborrecimento na leitura surgem com muito mais facilidade.


O que poderiam então fazer as editoras para combater isto? Simples. Para mim, bastava que os crossovers voltassem a ser um evento verdadeiramente especial. Se se tornassem realmente raros, ocorrendo apenas quando surgisse uma boa ideia, os leitores passariam a antecipá-los muito mais. Sentiriam assim que as histórias eram realmente importantes e por isso valorizá-las-iam muito mais. Fácil de dizer, quase impossível de acontecer... O problema é que, por mais que os crossovers se tenham tornado numa quase-rotina, as pessoas continuam a comprá-los. Podem já não ser o sucesso que eram, mas ainda "rendem" o suficiente às editoras para que elas não achem ainda que seria uma boa idéia estarmos uns dois ou três anos sem crossovers.

Talvez um dia...

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